Contos de Logan - Capítulo 04

sexta-feira, agosto 17, 2018

Boa noite, meus queridxs! 

Depois de algumas sextas-feiras, gostaria de dizer que eu estive ausente por ter viajado. Visitei minhas amigas e fiquei na casa delas. Agora, já em casa, trago a vocês mais um capítulo. Desculpem pela ausência.

Nesse capítulo, gostaria de avisar que há um termo de Harry Potter, e eu já o explicarei aqui mesmo, já que é apenas um. 

QUADRIBOL: um esporte bruxo, criado por J.K. Rowling. Os jogadores ficam montados em vassouras, em que precisam arremessar a goles (bola) para o os aros suspensos no ar. Nos filmes de Harry Potter, são retratadas várias cenas de jogos de quadribol. Existe um livro, da mesma autora, chamado Quadribol através dos séculos, que explica muitas coisas legais sobre o esporte. 

Finalmente, gostaria de dedicar essa postagem para um querido amigo que faleceu essa quarta-feira. Um colega de faculdade muito querido que sempre terei muito apreço. Vá em paz, Genubio, meu tocador de gaita preferido.

Além disso, para minha amiga Bárbara Rachel, parceira de clã, por ter criado um dos meus personagens favoritos. Sem você e ele (quem não irei declarar aqui para você, leitor, descobrir de quem se trata) Logan não seria nadinha. Muito obrigada. 

Vamos à leitura! 

xxxx


IV

Home?


— Quer namorar comigo?

     Eu acho que travei. Literalmente. Fiquei a olhando, paralisado, num olhar cheio de medo. Não esperava isso nunca, logo dela! Não fazia sentido na minha cabeça. Eu que planejei lhe pedir em namoro, não o contrário.

— Logan...?

       Começou um flashback frenético em minha mente, basicamente desde meus primeiros poucos anos, talvez sete, oito de idade, quando a conheci. O pai dela é amigo do meu, ou era, não sei como denominar agora. E, enquanto eles conversavam sobre assuntos do Ministério, afinal, foram colegas de trabalho, ficávamos nós dois, brincando. Estudamos juntos na mesma escola, na mesma sala, e eu sempre fui um abestalhado. Não vou mentir, ela sempre foi linda, e eu... Acho que estou começando melhorar agora. Espero que os anos sejam bons comigo.

      Leah sabe, sempre soube, que eu gosto dela. E eu acho que não é um simples gostar... Só que ela sempre me desprezou, se é que me entende. Uma vez, nos meus dez anos, nós dois, sozinhos, no parquinho, sentados um em cada balanço, eu me declarei para ela e Leah disse um “tá bom” bem murcho, quase um foda-se em linguagem de criança. Tinha dado até uma rosa vermelha... E ela me devolveu a flor.  

— Logan? – a voz dela foi mais dura do que eu gostaria e eu a olhei nos olhos, com o coração disparado e as mãos suadas.
Engoli seco. — Sim... – sorri largo, era tudo o que eu mais queria na vida, só foi inesperado e sem sentido.  — Eu quero, Leah.
— Ah, que bom...! – agora ela sorriu meio desdenhosa, com o semblante atrevido, como quem tinha uma ideia maligna a executar. — Só gostaria de estabelecer regras.
— Regras...? Mas...

        É engraçado como ela sempre mandou em mim... Sempre fez o que quis e mais um pouco comigo. Por que eu sou tão trouxa ao ponto de deixar?

— Sim, Log. Eu quero um relacionamento aberto. – ela nem me deixou falar.
— A-aberto? – mas isso não quer dizer que ela pode...?
— Sim. Aberto. Tudo bem para você?

    Eu só concordei porque estou anestesiado demais mentalmente. Não consegui processar isso na hora, pelo simples fato de ela ser minha namorada!!! Meu Merlin... É um dos meus sonhos se realizando! Horas depois ela foi embora e, ah...! Se despediu com um beijo! Eu não preciso dizer que fiquei abraçado no travesseiro, deitado, apaixonado...  

       Depois desse dia, nós ficávamos juntos na escola, andávamos de mãos dadas e em todas as vezes que ela enlaçava a mão na minha eu ficava com o coração acelerado. E nos beijos então? Eu desfalecia com as mãos macias dela me tocando o rosto, o pescoço, as costas... Admito minha inexperiência, ela me deu meu primeiro beijo – apesar de não ser o primeiro dela... É egoísta eu querer que fosse comigo? Pois, no fundo, eu sei que eu me guardei para ela. Romantismo à parte, idiotices à parte também...

       Ainda sobre a escola, Elijah me deu exatas dez carteiras de cigarro para vender. Se eu conseguisse vendê-las em duas semanas, as quantias de produtos só aumentariam, para medirmos meu desempenho e tudo mais. Só teríamos que organizar a forma que eu fosse receber os cigarros, talvez por coruja, já que minha avó não aceitaria um transformista estranho em sua casa de jeito nenhum. Só os ricos, de terno, do Ministério... E seus empregados.

       Mudarei para lá hoje, depois da aula. 
  
    Cinco e catorze. Logo escureceria... O céu estava se preparando para o pôr-do-Sol, preguiçoso, ainda azulado e cheio de nuvens brancas como o algodão. Já estava no trem de volta, sozinho no assento, vendo a paisagem da cidade. Essa linha ferroviária cruza a cidade toda, contornando todo o perímetro urbano. E a escola é um pouco longe de casa, o suficiente para dar algumas horas a pé. Então, prefiro ir de trem. Alisei as mãos, numa ansiedade idiota para chegar em casa. Ou não chegar. Não queria ver mais desordem, só queria que minha vida se ajeitasse...

     Senti as cicatrizes entre os ossos de meus dedos, algumas ainda têm casquinhas de feridas que eu adoro tirar. Cutuquei ali, numa memória não tão distante, do espelho se rachando e estilhaçando, da minha imagem fragmentada nos cacos incontáveis. Franzi os lábios sentindo um pouco de dor, os hematomas passaram há uns dias, pude desenfaixar na quarta-feira. Meus olhos correram dali para o verde-alaranjado das folhas lá fora, passando rápidas, dividindo o céu e a terra, colorindo o azulado bonito como um borrão de tinta na paleta.
   
   Quando cheguei em casa, já estava quase escuro. Minhas coisas foram todas encaixotadas, eu iria com Elliot para lá. Saímos, me despedi brevemente de minha casa – agora é minha, segundo as leis de morte e sei lá mais o que. Terei o direito de usá-la, judicialmente falando, quando tiver a maioridade. Não vai demorar muito, ao menos. Tinha uma caixa de viagem com Tod dentro e mais uma caixa em mãos, a dos pertences pessoais. Olhei-a uma última vez, por cima do ombro, e aparatamos.  
    
     A casa de meus avós fica num condomínio, o Nobiles Palace. O melhor da cidade, inclusive. Elliot me contou que até a ministra da magia e sua família moram lá. Não sabia disso, mas que lá é enorme, eu sei. Vez ou outra minha avó dava festas em sua casa e convidava toda a cidade - que só depois de um tempo fui perceber que era, literalmente, a elite de Evgéneia. Aurores, diretores de departamento, juízes, empresários... A lista é gigante se eu fosse descrever todos. Imagine só o luxo do lugar. Enfim, não é isso que nos convém.

     Minhas malas e demais coisas já haviam ido com Elliot mesmo, não sei como ele não fica tonto por aparatar tantas vezes! É uma mansão enorme, de estilo neoclássico, com uma fonte de pedra branca toda elegante a esguichar água - até ela parecia brilhar mais que o normal, deve ter sido encantada. O jardim muito bem cuidado, cheio de árvores podadas para parecer cones perfeitos, de arbustos que contornavam toda a extensão da casa, retangulares, como uma parede viva. O chão era todo de uma pedra brilhosa, acinzentada, intrincada belamente em pequenos quadrados até a entrada da mansão.

      As paredes brancas e altas se erguiam moldando a estrutura do lugar, de telhados azul-escuros, janelas em vidro e com detalhes em ouro puro. A enorme porta branca também tinha ouro a desenhá-la elegantemente. Sempre me senti um anão entrando aqui. Ao menos, agora que estou crescendo, as coisas parecem estar ficando menores. Elliot bateu à porta numa espécie de código e assim que um sino tocou, ele tocou a maçaneta dourada e vi-o fazer uma careta rápida de dor, depois abriu a porta.

     Meu pai já me explicou que há um reconhecimento sanguíneo na porta, de forma que, quando está fechada, poucas pessoas têm permissão de entrar. Elliot trabalhou nessa casa a vida toda, então, faz sentido que ele tenha seu sangue reconhecido. É uma picada no dedo que o fura e o sangue escorre ali, sendo absorvido por magia. Ali dentro continua sendo enorme para mim... O mordomo acenou para que eu passasse primeiro e entrei, com minha caixa nas mãos. Um hall do tamanho de meu quarto se fez presente, com dois mancebos dourados, um de cada lado das portas, o chão todo de mármore branco e com desenhos também dourados, paredes imensas e com quadros pendurados ali. Andamos.

— Senhor Logan, o senhor ficará no quarto de seu pai... Ordens da senhora Harrison.
— No quarto do morto? Sério mesmo?
Ele permaneceu naquele semblante servil. — Não há outro cômodo disponível, senhor. Sinto muito.
— Posso dormir com você? – olhei-o, tendo que erguer a cabeça para isso.
Seu olhos se tornaram amarelos e a pupila, um risco, olhar reptiliano. — A senhora Harrison não admitirá que seu neto durma com um criado. Você e sua inocência, senhor Logan. – ele tirou as caixas de minhas mãos. Tod estava adormecido.
— Você é muito mais que um criado para mim e sabe disso. Merlin... minha avó é uma fresca.

     Não tive tempo de ver o breve sorriso que ele esboçou em seus lábios ressecados. Eu não esperei o tabefe que levei na orelha esquerda, me fazendo ouvir um zumbido chato e olhei puto de raiva, sentindo a orelha esquentar.

— Respeito é bom, Logan. – a voz nada doce de minha avó me fez sorrir falsamente e quis rolar os olhos.
       
     A senhora Nancy Harrison, vulgo minha única avó – não faço a mínima ideia da família de minha mãe –, é uma velha até bonita que não aparenta a idade que tem, talvez por gastar pilhas de ouro com tratamentos milagrosos e rejuvenescedores. Alta, branca, tão branca quanto leite, de olhos azuis claríssimos e os cabelos tão loiros que chegavam a ser prateados. Algumas rugas aparentes, a pele já envelhecida, setenta anos nas costas não são fáceis de esconder. Se vestia elegante, como se tivesse acabado de sair de uma festa.

    Sempre foi assim, deve ter alguma linhagem de louros que só os Harrison têm, e que, bem, não faz parte de mim. Eu sou completamente diferente deles, da feição, dos olhos, dos cabelos e... Acho que até da índole. Pelos sonhos, mamãe é igual a mim, ou melhor dizendo, eu sou igual a ela.

— Por que eu tenho que ficar no quarto de meu pai? – reclamei, ainda com raiva.
— Porque não tem outro quarto, garoto. Ande logo. – seu tom de voz era impaciente.

    Ela me deu um empurrãozinho em meu ombro e segui de olhos cerrados em minha raiva. Já não queria estar ali, fui obrigado. Moraria sozinho numa boa, afinal, eu sempre morei sozinho. Não tenho culpa se meu pai não tinha tempo para mim. Elliot me levou até lá e vi minhas caixas empilhadas, espalhadas pelo quarto. Tinha uma enorme cama de casal, maior que a minha, paredes de cor cinza, dois criados-mudos, um de cada lado da cama, e nesta parede ficava a porta para o banheiro; um enorme tapete circular e felpudo, uma estante de mogno que ocupava uma das paredes inteira, onde o móvel se reduzia a apenas algumas prateleiras, ficava uma mesinha do mesmo material. Meu pai trabalhava ali. Na outra, o guarda-roupas fazia o mesmo, na última, ficava a janela, que era tão grande que parecia mais uma porta de vidro, em que mostrava o jardim de inverno, cheio de plantas exóticas, caras, e essas coisas de rico. Uma cortina que ia até o chão, branca, me possibilitava tirar toda aquela luz que vinha do lado de fora.  

     Tudo parecia vazio e organizado para que eu preenchesse como bem quisesse, menos os livros, que continuaram ali dando cor a essa imensidão cinza. A única certeza era: teria muito trabalho pela frente. Sentei na cama, é até macia, havia me esquecido de como era. Faz anos que não entro nesse quarto... Que ironia ele ser meu agora. Alisei o cobre-leito verde-escuro e aspirei, aqui ainda tem o cheiro dele, amadeirado, que sempre me lembra a sensação de estar num bosque. Sentia-me a violar um espaço que não me pertence.

— Senhor Logan?

   Ergui o olhar para Elliot, tinha esquecido de sua presença. Ele deixou minhas coisas sobre a cama e a caixa de Tod no chão. Sequei a lágrima que escorreu, foi inevitável.

— Sim...?
— Está com fome, senhor? Deseja um banho? Gostaria que eu arrumasse suas coisas?
— Bem... – eu estou com fome, mas foda-se. – Não, Elliot. Pode deixar que eu organizo tudo. Mais tarde eu passo na cozinha.
— Está bem, senhor. Se quiser algo, me avise.

     Ele fez uma leve reverência e saiu do quarto, fechando a porta. Olhei para aquele tanto de caixas de papelão e levantei para abrir a caixa de Tod. Ele saiu dali, espreguiçou-se e bocejou como quem acorda de um sono delicioso. Deixei que subisse na cama e ficou cheirando o ar, seu novo lar, infinitamente maior que o anterior.

— É Tod, nos mudamos. Desculpe o transtorno, amigo.

   Ele começou a correr na cama e a pular feito louco, ganindo feliz. Sorri fraco, a criaturinha sabe como me animar. Passei as horas seguintes desencaixotando coisas, separando, guardando, planejando onde deixá-las. Livros, roupas e sapatos, pergaminhos, materiais escolares, quadros... Sem falar no banheiro. Tive que refazer meu mini ateliê, que agora é bem maior, mas ainda sem móveis para organizá-lo direito.
   
     Oito e vinte e sete. Estava exausto e faminto, essa é a verdade.  

   Banhei-me, fiquei mais um tempo incontável na banheira, acho que até cochilei, só percebi que havia dormido por ter escutado batidas na porta.

— Logan?
— Estou no banheiro!
      
     Voz masculina, forte. Meu avô, senhor Garrett Harrison.

— O jantar está pronto, venha comer.
— Ok...

    O trabalho que eu tive para levantar dali foi imenso, vontade? Não tinha. Minha pele ficou toda enrugada. Demorei-me a me secar, pentear os cabelos, me perfumar e vesti a primeira coisa que me veio na frente: uma samba canção preta. Cheguei na sala de jantar, enorme, com uma gigantesca mesa de mogno com tantos lugares que eu perdi a conta. Acho que dezesseis. Vinte? E com outros adornos que, sinceramente, me deu preguiça de dizer. Só imagine uma coisa bem ricaça, elegante, luxuosa, para receber mais gente rica.  

— Logan! Vá se vestir, garoto! Que modos são esses?

    Eu rolei os olhos, rolei com vontade. Puta que pariu!

— Vó... Eu só vou comer, que diferença faz eu estar vestido assim?
— Isso é falta de respeito! De etiqueta! O que seu pai te ensinou? Ou já se esqueceu?! – ela falava esganiçado, quase nem respirava, com a cara vermelha.
— Não precisa gritar, meu Merlin...    
— Logan, vá se trocar, por favor. – o olhar duro de meu avô me fez encará-lo com desgosto.

    Igualmente loiro, alvo, praticamente da altura de Elliot, e de olhos também azuis. Essa porra é seleção natural ou o que? Eles dois até se parecem, digo, na fisionomia. E quem é que usa um terno após chegar em casa? A primeira coisa que eu faço é ficar pelado. Dei-lhes as costas, pisando forte, querendo esmigalhar o chão. Senti o olhar de Elliot e o olhei brevemente, mais o da cozinheira, Louise. Lá fui eu, caçar roupas que não tinha terminado de arrumar, jogando tudo com raiva pelo chão e Tod me olhava meio assustado.

   Bufava de raiva quando voltei, de cara fechada, sem olhar para esses dois caretas. A comida foi servida, cordeiro assado, purê de batatas, molho bechamel, uma salada de folhas variadas e outra de ovos. O cheiro é até nostálgico, além de maravilhoso. Eu comi como se tivesse ficado dias sem me alimentar, pouco me importando com a etiqueta, modos e essas porcarias. Ouvi ela reclamar? Ouvi. Obedeci? Claro que não. Meu avô teve que intervir e agradeci mentalmente, mas ainda estava puto com eles dois.

   A sobremesa era um pudim de quatro leites e salada de frutas. Apenas peguei uma porção do pudim e deixei separado um pouco do cordeiro para Tod. Saí da mesa sem pedir licença, apenas agradeci a Louise pela comida – havia me esquecido como ela cozinha bem, e que comida divina! Ela deu um sorriso tímido e reverenciou-me como se eu fosse uma espécie de lorde. Aliás, como todos os criados daqui fazem.

    Louise é uma senhora de sessenta e poucos anos, de corpo rechonchudo e ainda assim, muito belo. Cabelos grisalhos, olhos castanhos e grandes, baixa, a pele enrugada e o uniforme de cozinheira. Transformista. Elliot me contou que ela se transforma em animais bovinos. Nunca a vi transformada. E bem... só vi o mordomo transformado no dia em que eu soquei o espelho.

   Só sei que me enfiei no quarto, tranquei-o, e não tive um pingo de vontade de sair dali. Eu não entendo. A ideia de se morar em conjunto é, basicamente, ter harmonia entre as pessoas que se convive. Como começar essa harmonia implicando com todas as coisas que eu faço? Eu estou "em casa" e, quando se está em casa, você gosta de se sentir confortável. Comer da maneira que quiser, o que quiser, enfim.

   Quando eu crescer, meus criados - se é que eu vou ter criados, não vejo necessidade de rotular assim - comerão comigo na mesa, da mesma comida que eu, não precisarão ter um uniforme e muito menos me chamar de senhor a cada instante. Elliot, por exemplo. O homem usa terno 24h por dia, nunca vi ele com outra roupa. Será que ele dorme de terno? Meu Merlin... absurdo. Além de em todas as vezes que me chamar, usar senhor. Eu tenho 14 anos!!! Nem senhor eu sou!

    Soquei o travesseiro num som surdo e respirei fundo, querendo gritar com todo o ódio do mundo. Quer saber? Foda-se! Apaguei as luzes do quarto. Peguei uma carteira de cigarro e o enfiei no bolso, minha varinha, um casaco, calcei alpargatas e fui até o banheiro. Acima da banheira, havia um basculante e ele seria perfeito para meu plano de fuga. Subi nela, equilibrei-me na beirada e abri o basculante, pulando e me esgueirei pelo espaço horizontal, tendo que ficar completamente deitado para passar por ele. Rolei e caí meio desajeitado. Não era alto, nas próximas vezes vou conseguir sair melhor. 

    Admirei o jardim, estava na parte de trás da mansão. Sentia o vento soprar com força, esvoaçando meus cabelos e os bagunçando. Era como se ele entendesse meu ódio... Senti um frio gostoso por eles estarem molhados. Deixei aberta para poder voltar depois, só teria que descobrir como dar um pulo decente. Como costumo fazer, eu fui sem rumo pelo condomínio, apenas para caminhar. Não tinha onde ir, não vinha aqui há muito tempo. Só queria espairecer mesmo.

    Andava examinando, vendo as casas enormes, uma mais linda que a outra, modernas, cheia de adornos, como se competissem entre o dono da casa mais bela. O condomínio é dividido, literalmente, no meio: a metade esquerda é dos transformistas, a da direita, dos bruxos. E aqui é tão grande que parece uma vila. O Nobiles Palace corta a cidade exatamente na divisória criada historicamente nessa rixa bruxa e transformista.

   Têm mercados, academias, escolas, praças, quadras de quadribol*, salão de festas, enfim! Tudo exclusivo para cada raça... Um transformista só pisa na parte bruxa se for reservado com muita antecedência, assim como os bruxos também devem fazer. Quem é que precisa reservar com pelo menos 48h para ir visitar o amigo do lado? Se é que são amigos... Quem me contou tudo isso foram Elijah e Kailee.

    Aliás, todo mundo sabe desse condomínio, é o cúmulo da hipocrisia. Vamos viver em harmonia! Entretanto, vamos viver em lugares separados, imagine só se meu filho puro sangue encontra um transformista! Que horror! E isso vale para o inverso, de forma que a maioria dos transformistas têm medo, asco, e muitas coisas mais por bruxos. Principalmente os ricos. Aliás, é difícil ter alguém pobre nessa cidade.

   O casarão de meus avós fica na parte final do condomínio, perto da praça. Fui até lá, reparando como aqui o paisagismo é muito utilizado, além de que não tinha uma folha no chão – e olha que estamos em pleno outono. Caminhei até adentrar o lugar, havia um belo lago de água cristalina, vários quiosques, bancos, casas de pássaros, pistas para caminhada, um parquinho infantil... Dava para ver o campo de quadribol dali também, mais ao fundo. A iluminação era feita por lamparinas a óleo penduradas numa estaca de madeira. À medida que eu andava, mais lamparinas se acendiam, até um bom pedaço do lugar estar iluminado.

7. Canyon Lake Park: A Little Slice Of Heaven Hiding Right Here In South Dakota

    Sentei num dos bancos abaixo de uma araucária enorme e tirei o cigarro do bolso. Acendi e traguei, sentindo um alívio inexplicável, como se a fumaça abraçasse meus pulmões e acalentasse meu corpo estressado. Libertei-a por meus lábios demoradamente, e fitei o céu, de estrelas mais brilhantes no dia de hoje. Amanhã fará uma semana que ele se foi.

    Travei a maxila num ódio interno, ódio por ele ter me abandonado, por me deixar com dois velhos chatos...

— Tchau, Beren! Até mais!

    Franzi o cenho e não deixei de sentir meus dentes rangerem, da minha cabeça reclamar pela força que eu colocava ali. Um grupo de garotos estava vindo do campo de quadribol e alguns deles tinham vassouras consigo, menos um deles. Eles pareceram se separar e eu reclamei mentalmente, porque minha paz interior havia sumido. Traguei de novo, fingindo que não tinha visto ninguém passar.

— E aí, cara? Nunca te vi por aqui, se mudou pra cá?

  Ergui o olhar, vendo o único que não tinha vassouras. Altura mediana, os cabelos vermelho fogo, vestido com roupas compridas, calça, camiseta, tênis. Eu não sinto tanto frio assim. Quero dizer... Para mim está normal. Ele é familiar, mas não sei de onde o conheço. 

— É... Eu me mudei hoje. – expirei a fumaça. — Aceita um?
— O que é isso? – ele olhava meio curioso.
— É um cigarro, é um item trouxa.

     Ele não pareceu ter asco, apenas estranhou. Faz sentido. E isso me deixou curioso... Ele não é um bruxo puro-sangue? Deveria me abominar agora. Ao menos ele é simpático e... estranhamente, eu me sentia bem perto dele, como me sinto com Kailee.

— Ah, não, valeu. Onde você mora? – ele se sentou.
— Na casa dos Harrison, a casa 20... São meus avós.
— Ah! Agora sei de onde te conheço... Você é o filho daquele auror. Poxa, meus pêsames. Eu tava no velório, bem... Eu sou o filho da ministra, te cumprimentei e tal...

     Travei a maxila. Então é por isso que ele é familiar... Sorri fraco e traguei, ao menos eu o conheci antes, não é?

— É, meu pai... – liberei a fumaça pelo nariz. — Por ele ter morrido, eu vim pra cá, morar com meus avós.
— Hum... – ele coçou a cabeça, meio nervoso — Eu preciso ir... Foi massa te ver. Opa, eu não me apresentei. Sou Beren Teleri.
Beren me estendeu a mão e eu ergui a sobrancelha, a encarando, depois seus olhos. — Logan Harrison. – apertei de volta.
— Nos vemos por aí, Logan! Moro na casa 10. Só me chamar. – Beren se ergueu do banco.
— Ok. Até. – falei meio seco.
      
     O garoto foi e eu fiquei ali por mais algumas horas. Os cigarros foram acabando fáceis, um atrás do outro. Eu não conseguia parar, era mais forte que eu. Acabei voltando para a mansão quando todos acabaram, joguei-os no lixo ali perto, afinal, imagine só um bruxo ver um cigarro!
     
     Eu não tinha consciência ainda, mas esse garoto dos cabelos de fogo se tornaria uma das pessoas mais importantes para mim. 

xxxx   

Obrigada pela leitura! Comentem, compartilhem com os amigxs, espalhem amor! 

Um abraço, Gih Amorim. 

<3

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3 comentários

  1. A primeira a comentar, pq eu sou top modelo!! AHH!! Beren do meu Core <3 E não preciso nem falar o ódio que eu to desses avós ¬¬ inferno! Vai se lascar, eu como nua se eu quiser! Oushhh!!

    Gih!!! mais um cap to modelo de sempre!!! <3

    beijos de fogo!

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    1. Obrigada, Gabiii!! AUHSHSU sabia que você iria falar das roupas. Berenzinhooo <3

      Um abraço!

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  2. BEREEEN, aaah meu shipp gay que nunca vai acontecer apareceu <3

    Apenas no curti o tapa na cara que levei de primeira com esse pedido de namoro u.u alem dos avos do Logan, peloamor.

    Adoreeeei demaisss esse capitulo, tava com sdds do Loguinhoooo e ja quero o proximo!! s2

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